Diz
o livro do Eclesiastes: “Tudo é vaidade… um homem que trabalhou com
inteligência, competência e sucesso vê-se obrigado a deixar tudo em herança a
outro que em nada colaborou” (Eclesiastes 1,2.21). O que diríamos mais ainda de
quem rouba, aproveitando-se de cargos públicos, acumula fortunas em imóveis,
joias, dinheiro até em bancos de outros países! Muitos não pensam que vão
morrer. No mínimo, quem tem altivez de caráter, gostaria de ser lembrado como
gente do bem, de ética, de moral, de honestidade e de trabalho intenso pelo bem
comum, sem lesar o público, principalmente o mais carente. Até os herdeiros de
fortuna e qualquer dinheiro desonesto deveriam ter a grandeza moral de
restituir o que sabe desse legado podre. A justiça deveria fazer o sequestro do
dinheiro roubado.
A formação do caráter para o respeito ao outro e ao que lhe
pertence deveria ser regra de ouro das famílias, das escolas e dos meios de
comunicação. O rito dos processos judiciários deveria dar sim, o direito de
defesa, mas com limites. Atualmente os recursos são quase infinitos. Quem sofre
injustiça é ainda mais injustiçado com a demora do veredicto judicial.
Dentro da realidade dos extremos de riqueza e pobreza, em que
uns têm demais e grandes parcelas têm de menos, é muito importante a formação
para o cultivo da simplicidade. Isso exige vida menos luxuosa de elites, que
quase não pagam impostos em comparação com os assalariados. A hipoteca social
da riqueza deveria incluir a exigência de mais tributos por parte de quem
recebe muito em relação à maioria. Abusos de salários e aposentadorias de
determinados grupos privilegiados de vários poderes gritam por justiça.
Quem assume a vida com valores transcendentes deveria olhar para
o objetivo da mesma. Em agradecimento ao Criador pelo dom da vida e pelas
oportunidades de realizar o bem da comunidade, tais pessoas poderiam contribuir
mais com uma convivência de promoção real da inclusão social dos mais
fragilizados. A recompensa virá, não somente de Deus na eternidade, mas também
já na terra, com sua respeitabilidade e reconhecimento de seu bom exemplo. A
vida vale e recompensa por si mesma quando se usam os talentos para o serviço
ao semelhante.
Nada é mais seguro na vida do que realizar o bem ao outro por
causa daquele que nos criou para isso. As seguranças terrenas são importantes,
mas não são objetivo de vida. São instrumentos a serem bem usados. Distorcidos,
corrompem o coração, a mente e o convívio social. Assim são as coisas
materiais, os prazeres e o poder. Tudo tem seus valores e suas normas
objetivas. Se as normas forem apenas o desejo pessoal e os instintos, ficamos
no chão da vida sem olhar para o objetivo mais elevado. A natureza criada por Deus
já o revela. O que dirá o Filho de Deus (Cf. Colossenses 3,1-2)! Ele não tinha
nem onde reclinar a cabeça. Deu tudo de si, mostrando que a vida vale para
darmos vida de sentido aos outros!
Jesus lembra que a ganância não realiza a pessoa humana. A felicidade
não está na abundância de bens. Ele narra a estória de um homem que fez grande
armazenamento do que colheu da plantação, pensando que ia ter vida cômoda por
muitos anos. Mas, de repente, morreu e não usufruiu do que acumulou (Cf. Lucas
12,13-21). Quem mais tem coisas e exagerado bem estar materiais, em geral não
se contenta com o que tem. Muitos não têm paz na vida, preocupados em
administrar suas riquezas materiais. Outros têm pouco e são felizes por
realizarem o bem. É justo ter o necessário para se viver dignamente e fazer o
bem, mesmo tendo bastante, para servir a comunidade. Os bens sem hipoteca
social são ilusão e vaidade inútil.
Por Dom
José Alberto Moura – Arcebispo de Montes Claros (MG)
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